Inundações extremas na Amazônia mais severas e frequentes

Desde a década de 1990, a variabilidade do ciclo hidrológico na bacia amazônica está aumentando. E a principal alteração se verifica na frequência e na intensidade de inundações muito severas, identificou estudo de um grupo internacional de cientistas.

Pesquisas anteriores se concentraram sobre a ocorrência de secas no centro e no sul da Amazônia. Secas extremas sazonais na região geralmente estão ligadas a eventos do El Niño no Pacífico tropical ou à temperatura da superfície da água do mar na zona tropical do Atlântico Norte.

Exemplos de eventos extremos de seca foram os anos de 2005, 2010 e 2015. A tendência de fortalecimento da seca pode estar associada ao desmatamento e ao aquecimento global.

Todavia, segundo o estudo, as mudanças recentes na hidrologia da Amazônia são marcadas também por eventos extremos de inundações. A partir de 2009, enchentes severas se tornaram recorrentes na região noroeste e ao longo do rio Amazonas e alguns de seus afluentes.

Para aprofundar o conhecimento sobre essa tendência, os cientistas analisaram os registros do nível da água do rio Negro no Porto de Manaus, abrangendo o período entre 1903 e 2015. Outras fontes de dados foram uma estação no rio Amazonas, cobrindo os anos de 1970 a 2015, e séries atmosféricas e de precipitação.

Adotou-se a definição do Serviço Geológico do Brasil para secas e inundações extremas. As primeiras se caracterizariam por níveis do rio Amazonas de 15,8 m na cidade de Manaus, enquanto as segundas, por níveis de 29 m.

Entre 1903 e 2015, o estudo detectou 14 secas hidrológicas severas e 14 inundações severas. Não ocorreu nenhuma alteração na frequência de secas hidrológicas severas durante o período. As inundações, no entanto, apresentaram uma tendência de aumento a partir de 1970.

Estimativas do estudo indicaram que a frequência de inundações extremas subiu cinco vezes. Durante a primeira metade do século XX, as inundações extremas ocorriam com periodicidade de uma vez a cada 20 anos. Do ano 2000 em diante, elas passaram para uma vez a cada 4 anos.

O gráfico superior mostra os registros do nível d'água entre 1903 e 2015. Indicados em azul as secas hidrológicas e em vermelho, as inundações. O gráfico inferior apresenta a alteração no tempo de recorrência de secas (vermelho), inundações (azul) e de ambos combinados (cinza). Fonte: adaptado da figura 1 do estudo.

A partir de uma análise dos eventos individuais de inundações extremas, os cientistas apontaram que, além da frequência, também aumentou a intensidade. Por exemplo, as inundações excepcionais registradas nos anos de 2009 e de 2012 alcançaram níveis sem precedentes históricos tanto em duração quanto em gravidade.

Os cientistas classificaram os dados dos anos mais recentes como altamente anômalos. Com exceção do ano de 2010, no qual se deu uma seca severa, e do ano de 2011, todos os outros no período entre 2009 e 2015 registraram um evento extremo de inundação.

A tendência de mudanças das chuvas na Amazônia estaria vinculada ao fortalecimento da circulação de Walker, um sistema de circulação de ar gerada a partir da interação entre o oceano e a atmosfera no Pacífico.

Segundo o estudo, o rápido aquecimento das águas superficiais do Atlântico tropical, junto com a tendência contrário no leste do Pacífico, teria contribuído para o fortalecimento da circulação de Walker, evidenciando como diferentes bacias oceânicas estão interligadas.

A mudança nas chuvas não deverá se prolongar. O estudo apontou que, na próxima década, o contraste de temperatura entre as águas dos oceanos Pacífico e Atlântico deverá diminuir, reduzindo a intensidade da circulação de Walker.

Todavia, devido ao aquecimento global, a expectativa é de que as águas tropicais do Atlântico mantenham a tendência de aumento da temperatura. As inundações severas na Amazônia irão reduzir, porém continuarão maiores do que os níveis registrados antes de 1990.


Mais informações: Barichivich, Jonathan, et al. "Recent intensification of Amazon flooding extremes driven by strengthened Walker circulation." Science advances 4.9 (2018): eaat8785.
Imagem: Flickr/ Lucia Barreiros da Silva

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